quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

Olha ele aí de novo...

Já há alguns dias que começou discretamenta a campanha a favor de José Dirceu "Anistia Já!", lançada, ao que parece, pela Juventude Petista. O objetivo central da campanha é reunir assinaturas e enviar ao Congresso Nacional uma proposta de emenda constitucional que anistiaria José Dirceu, devolvendo seu direitos políticos.

Enfatizando: ao que parece, esse movimento não tem nada a ver com nenhum figurão petista, nem com Lula, nem com a ala do Campo Majoritário. Também não tem nada a ver com pretensões eleitorais para 2008 ou 2010. Ao que parece.

Dirceu começou tímido, mal-disfarsando a surpresa da homenagem (?) dos jovens petistas ao líder partidário. Começou assim, mas já começa a dar entrevistas aqui e acolá, conversando com fulando, rindo pra sicrano, batendo nas costinhas de beltrano. Ao que parece.

O argumento - frágil por sinal - de Dirceu é o de que ele foi condenado sem provas pela Câmara dos Deputados e que no Supremo Tribunal Federal ele poderia provar cabalmente o sem-propósito de sua cassação. O argumento é frágil, e velho, pois Dirceu sabe (como parlamentar experiente que foi) que o processo e o julgamento da Câmara são político, não jurídico. Ele não é o primeiro, nem será o último que terá sido condenado por um grave erro político, não necessariamente legal. Talvez o caso mais conhecido seja o de Collor, que foi cassado no plano político e absolvido no STF e de lá saiu com a ficha mais limpa que a minha, talvez.

Lula disse e redisse e desdisse que pretende fazer um governo de coalizão, que reúna os setores mais diversos da sociedade, as diversas correntes políticas, partidos, etc. Uma consertación brasileira - coisa que Fernando Henrique também buscou fazer mas não conseguiu. Lula fala muito, mas é cada vez mais infantil querer dar crédito às suas promessas. Como um governo que pretende unir o país em um grande esforço pela justiça social e o desenvolvimento econômico e democrático do país pôde permitir a desarticulação vista na eleição para presidente da Câmara, pode demorar tanto para anunciar um ministério enxuto, eficiente? Poderá dar apoio ao pedido de anistia a um homem envolvido com escândalos - os mais nefastos recentemente vistos - de compra de votos, abuso de poder político, sem falar da incompetência gerencial com que tocou a Casa Civil - controlando tudo com mão de ferro, sem flexibilidade, sem agilidade, sem inteligência?

Ao que parece, é a Juventude Petista que quer a "Anistia Já!", não é ninguém da Câmara, ninguém como Palocci ou Genuíno ou Chinaglia, ninguém que poderia usar seu poder institucional para atender a interesses partidários, ao que parece, não.

Carnaval para muitos cordeiros e poucos lobos

Por Bob Fernandes

O Carnaval de Salvador acabou, decretou nosso colunista Antonio Risério num desabafo pré-momesco. (Leia aqui).

Difícil entender como um Carnaval que arrasta multidões nas ruas por quase uma semana possa ter "acabado", mas quem freqüenta o Carnaval baiano sabe ao que Risério se refere.

Alegria engarrafada, industrializada, vendida para uns tantos se comparado ao todo, e em nome - e conta bancária - de muito poucos.

Alegria embalada em abadás e camarotes só para quem tem e pode, alegria que é, mantidas as óbvias dessemelhanças, um simulacro de outro carnavalzão paquidérmico, o do sambódromo carioca.

Um, como o outro, cada vez mais montado segundo a lógica repetitiva, pobre, chula e chulé de emissoras de televisão.

Não se desconhece o trabalho insano, o amor e dedicação idem, o esplendor e a beleza de escolas no sambódromo, mas o que se discute aqui é uma outra coisa: em nome de quem, e para quem, os megacarnavais? A propósito, leia aqui os colunistas Marcio Alemão e Ronaldo Correia de Brito.

O Carnaval do Rio de Janeiro, neste 2007, entrará para a história como aquele em que a Mangueira barrou Beth Carvalho e seus 36 anos de escola.

Carnaval, o de 2007, em que a verde e rosa negou duas fantasias para a família de Nelson, 82 anos de história, Sargento, enquanto o tráfico distribuía 20 fantasias - R$ 600 cada - para uma de suas alas, como informa Xico Vargas em sua Ponte Aérea RJ.

Beth Carvalho e Nelson Sargento postos para fora e, dentro, todos aqueles traseiros de ocasião; não se discutirá a excepcional, ou não, qualidade das ancas, as deste ou de muitos verões, nem os mililitros de silicone, mas como não pasmar ante a quantidade de árvores abatidas para que se possa ler e saber se a Grazi, a Juliana, a Preta, a Galistéia, ou qualquer uma do próximo verão tem... samba no pé?

O Rio de Janeiro largou na frente da Bahia na luta pelo desempacotamento da alegria no Carnaval. São centenas e centenas de blocos, uns filhotes dos outros e nascidos, quase todos, do encontro da escassez com o excesso.

Excesso de candidatos à alegria que tornam escassos o espaço e o único combustível não químico desta alegria, a música. A saída seria aumentar a quantidade de músicos, a potência do som, mas aí chega-se a um... trio elétrico.

Um trio elétrico, se uma prefeitura ou um estado não o alimentam diretamente torna-se uma máquina de engolir dinheiro, donde os blocos, os abadás de setecentos, oitocentos, mil, mil e quinhentos reais.

Trios, abadás e, como ninguém é de ferro, passe-se uma corda ao redor do bloco e enfie-se centenas de cordeiros, homens e mulheres - R$ 17 por dia, mais um lanche - para garantir a integridade; a da corda.

Quem não pode pagar? Que se esprema na calçada.

Um Carnaval para muitos, muitos cordeiros. E pouquíssimos lobos.

O Rio resiste. O Boi Tatá, que um dia saiu com uns 300, na manhã do domingo recebeu 6 mil candidatos à alegria, 35 graus à sombra. Filhote já com mais de um ano, a dissidência Boi Tolo escafedeu-se da Praça Quinze arrastando seus ainda 300.

Em Salvador, quem sabe uma esperança? Carlinhos Brown anunciou e lançou o Pipocão, um arrastão sem cordas. Por ora, apenas esperança. A Timbalada, do mesmo Brown, um dia foi um filhote sem corda, como também o foi o bloco Os Mascarados, de Margareth Menezes.
Ambos, um ou dois carnavais depois, devidamente empacotados.

Nas cinzas a Bahia chora e discute, como não poderia deixar de ser, seus mortos e feridos. Seis assassinatos, não necessariamente ligados ao circuito do Carnaval, 53 arrastões não momescos, 1.650 ocorrências...

- Não é muito, a se contar que temos mais de um milhão de pessoas nas ruas - diz um assessor carnavalesco.

A frase contém uma mentira que, pela repetição, tornou-se verdade. E que não descobre a ferida.

A mentira está no milhão. Uma cidade com 3 milhões de almas, incluídas as dos arredores, não tem, e não teria como ter, um milhão de humanos nas ruas; se a metade dessa hipotética multidão se decidisse por um xixi mais ou menos à mesma hora, a Bahia viveria um tsunami nas suas avenidas e ladeiras.

Tal milhão, chutado um dia nos dias das grandes e recentes mentiras oficiais, colou, ficou. Ponto.
A ferida? Estava na capa do jornal A Tarde nos últimos dias de dezembro passado:

- Salvador, a segunda cidade mais desigual do mundo.

Números oficiais, selo da ONU. À frente de Salvador no ranking mundial de desigualdade apenas algum ponto na Namíbia. Donde, com a camarotagem invadindo espaços públicos, a abadagem usurpando as avenidas e segregando ainda mais num Carnaval de cordeiros, seis assassinatos soam como se não fosse "muito".

PS: Em tempo. Isso pouco pode significar para quem, durante, bebeu um ou mais litros de algo com álcool, inalou Universitário, Loló, cal e assemelhados, para quem, em resumo, tenha ingerido qualquer aditivo em estado sólido, líquido ou gasoso. Pode não importar também para quem encontrou o grande amor, senão da vida pelo menos daquela tarde, noite, ou hora.

Quem vos escreve adianta: se deu bem, está no Carnaval desde as primeiras lembranças da infância, e adora estar.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

Lukács


György Lucáks (1885-1971) foi filósofo e político Húngaro de origem judaica, ingressou no Partido Comunista Húngaro em 1918. Foi Comissário do Povo durante o efêmero governo de Bela Kun, e tornou-se, no pós 2ª guerra, uma espécie de porta voz do Marxismo intelectual, sobretudo após a discussão pública que o opôs a K. Jaspers e outros filósofos ocidentais nos Encontros Internacionais de Genebra, de 1946. Ministro da Educação do Governo de Imre Nagy, foi deportado para a Romenia após a invasão da Hungria por tropas soviéticas em 1956.

Aqui no blog está disponibilizado o download do texto "As bases ontológicas do pensamento e da atividade humana".

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

PAC na mídia - Avaliações levianas e tendenciosas

Certa vez, em entrevista ao Roda Viva, na TV Cultura, um dos entrevistados estava difamando várias personalidades do mundo político, acadêmico e artístico quando foi interpelado pelo mediador, que lhe perguntou:

– Tirando o senhor e Deus, quem mais presta no mundo?

A resposta:

– Eu não sei!

A mesma atitude vem sendo tomada pelos colunistas de economia há muito tempo e, em especial, no lançamento do PAC (Programa de Aceleração de Crescimento).

Muito mais do que ceticismo, a grande maioria dos colunistas dos principais jornais do país que tratou do tema fez avaliações sinistras do plano e, em cerca de sete parágrafos, resolvia que o problema econômico do crescimento do país era este ou aquele ponto "crucial" que não havia sido elaborado de forma correta pelo programa ou havia mesmo sido ignorado. Cabe notar, porém, que a maioria das colunas, embora tratasse do PAC, não continha um ponto crítico comum. Quase como quando se lê horóscopo em diferentes jornais.

Pouca credibilidade

Quanto à cobertura dos veículos impressos, não divergiu muito da obscuridade. Folha de S.Paulo e Estado de S.Paulo procuraram dar uma ampla atenção ao tema e seus cadernos econômicos foram quase que exclusivos sobre o PAC. A Folha pecou por não se aprofundar muito nas medidas e a manchete principal do caderno "Dinheiro" não poderia ter sido mais óbvia, tratando-se de um Programa de Crescimento Nacional: "Plano depende de empresários e oposição" (terça-feira, 23/01). Em seu editorial, o jornal chamou as medidas de "genéricas" e adotou uma posição totalmente avessa às propostas do plano, porém sem esboçar argumentos que pudessem sustentar seu ponto de vista de forma plena e sensata. Clóvis Rossi, colunista do jornal, em artigo intitulado "PAC, falar e fazer", foi quem, dentre todos os comentaristas, elaborou a melhor análise sobre o programa, fugindo das previsões futuristas dos astrólogos e dos comentários de balcão de boteco.

O Estado de S. Paulo, embora tenha feito uma cobertura mais ampla e se aprofundado mais sobre as medidas, teve poucas matérias "isentas" de sua posição editorial e poucas que realmente tivessem o mérito da credibilidade. O jornal chegou mesmo a estampar em sua capa uma manchete ridícula tratando-se de um programa de crescimento elaborado pelo presidente da República: "Dinheiro público sustenta plano" (terça-feira, 23/01). Mas, então, com que dinheiro o PAC deveria ser elaborado? Apenas com o lucro das empresas privadas? Dentro do jornal encontramos também uma manchete decididamente tendenciosa: "PAC pode dar a Dilma passaporte para 2010" (terça, 23/01). Quais os argumentos para o Estado fazer esta afirmação? Quais os critérios adotados pelo jornal ao publicar, sob a configuração de notícia, uma matéria opinativa?

Ritos cabalísticos, previsões obscuras

Marcelo Beraba, ombudsman da Folha, criticou certa vez os veículos de comunicação por não contarem com jornalistas especializados em suas redações. Segundo ele, este fato acaba gerando matérias insossas, sem informações e superficiais e, assim, as reportagens ficam apenas ocupando espaço editorial e em nada esclarecem o leitor (muitas vezes leigo) sobre o fato ocorrido. Esta crítica de Beraba fica mais nítida no caso atual, quando os jornais impressos, em especial o Estado de S.Paulo, foram ainda mais tendenciosos do que se esperava.

Não cabem aqui análises sobre as medidas do PAC, nem sobre seus efeitos na economia, visto que as mesmas ainda estão no papel e seu caráter não é definitivo. Mas, enquanto só o deus de cada um prestar no mundo e todo o pensamento for voltado para ele, é melhor cada um pegar suas crenças e ir para um retiro espiritual. Afinal, a sociedade depende, dentre outras coisas, de um pensamento sensato no coletivo, e não de ritos cabalísticos de previsões obscuras e sem fundamento.

Cássio Caetano Gusson Schiavi